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Raúl Perez

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Raúl Perez




CURRICULUM
Raúl Manuel Perez nasce em Lovelhe (Minho) a 26 de Abril de 1944

1972
Primeira exposição individual: expõe dezasseis imagens do seu Diário Onírico na galeria de S. Mamede (Lisboa).

1973
Adere ao grupo Phases (Paris).

1974
Participa numa exposição organizada pelo grupo Phases no museu de Ixelles (Bruxelas).

1975
Participa na exposição O Cadáver – Esquisito, Sua exaltação, Seguido de Pinturas Colectivas, comemorativo do 50º aniversário do movimento surrealista de Paris, galeria Ottolini (Lisboa).

1976
Participa, integrado no grupo Phases, na exposição surrealista internacional Marvelous freedom- Vigilance of Desire, organizada pela revista surrealista norte-americana Arsenal, galeria Black Swan (Chicago).
Ilustração para a capa do romance de Julien Gracq Au Château d’Argol (Editora Meulenhoff, Amesterdão).

1977
Participa com Rik Lina, Philip West e Cruzeiro Seixas numa Exposição organizada pela revista Surrealista holandesa Brumes Blondes, a convite do seu editor, o poeta Laureus Van Krevet, galeria Bouma (Amesterdão).
Participa na exposição O Erotismo na Arte Moderna Portuguesa, Junta de Turismo da Costa do Sol (Estoril) , Sociedade Nacional de Belas Artes (Lisboa) e Museu Soares dos Reis (Porto)
Participa na primeira exposição Phases em Portugal, Junta de Turismo da Costa do Sol (Estoril), Galeria Dois (Porto), Museu Machado Castro (Coimbra) e Sociedade Nacional de Belas Artes (Lisboa).
Expõe pinturas e desenhos na Junta de Turismo da Costa do Sol (Estoril).

1978
Participa na exposição Imagination – International Ausstelung Bildnerischer Poesie, realizada no Museu de Bochum (Alemanha).
Participa na exposição de homenagem a António Maria Lisboa, organizada por Cruzeiro Seixas na galeria da Junta de Turismo da Costa do Sol (Estoril).
Participa na Terceira exposição Phases em Portugal, museu Francisco Tavares Proença Júnior (Castelo Branco). 1979
Expõe quinze pinturas na galeria Dois (Porto) e galeria Tempo (Lisboa).

1980
Ilustração para a capa da primeira edição holandesa de O Barqueiro Anarquista, de Fernando Pessoa (Editora Melenhoff, Amesterdão).

1981
Participa na exposição Papeles Invertidos, Aula Cultural Caja Insular de Ahorros (Sta Cruz de Tenerife, ilhas Canárias).
Participa na exposição Ícono-bibliográfica Três Poetas do Surrealismo: António Maria Lisboa, Pedro Oom e Mário Henrique Leiria, organizada por Mário Cesariny na biblioteca Nacional (Lisboa).
Expõe pinturas e desenhos na galeria da Junta de Turismo da Costa do Sol (Estoril).
Ilustração para a capa do romance de Julien Gracq Le Rivage des Syrtes (Editora Melenhoff, Amesterdão).

1982
Expõe pinturas na galeria de S. Mamede (Lisboa).

1985
Expõe pinturas na galeria de S. Mamede (Lisboa).

1986
Participa na exposição O Fantástico na Arte Portuguesa Contemporânea, Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian (Lisboa).

1988
Expõe pinturas na galeria de S. Mamede (Lisboa).

1992
Participa numa exposição organizada pela revista surrealista madrilena Salamandra, Estúdio Ancora (Madrid).

1994
Participa na exposição Surrealismo ou Não, galeria de S. Mamede (Lisboa).

2003-2004
Expõe pinturas e cadáveres - esquisitos com Cruzeiro Seixas, galeria de S. Mamede (Lisboa).
Participa na exposição La Belleza Convulsiva, Casa de la Província (Sevilha).
O Surrealismo Abrangente (colecção particular de Cruzeiro Seixas), Fundação Cupertino de Miranda (V. N. de Famalicão).
O Surrealismo na Colecção da Fundação Cupertino de Miranda, museu de Tapeçarias de Portalegre.

2005
Expõe pinturas com Carlos Calvet e Cruzeiro Seixas na livraria Ler Devagar (Lisboa)
O Surrealismo Abrangente (colecção particular de Cruzeiro Seixas, Sociedade Nacional de Belas Artes (Lisboa) e Convento de S. José (Lagoa).

2006
Fernando Lemos e o Surrealismo, Centro das Artes Casa das Mudas (Calheta – Madeira)
Raúl Perez, obra plástica, Fundação Cupertino de Miranda (V. N. de Famalicão).

2008
Expõe desenhos na Galeria Cidiarte (Lisboa).










"PASSAGEM DE RAÚL PEREZ

O continente surrealista, que emergiu entre as duas grandes guerras do século XX, marcou o século de vários sinais que talvez não tenham ainda deixado de se fazer sentir, quer no plano imaginário - em grande parte um conceito emergente da sua teoria naquele que terá sido, provavelmente, o contributo maior desta corrente artística - quer, ainda, no plano formal. E, ao contrário do que muitas vezes se diz, o Surrealismo, que foi decerto uma revolução, não falhou o seu propósito ainda que, e de modo semelhante às demais revoluções, não o tenha visto completamente cumprido nos seus vastos pressupostos.

Foi porém o segundo surto do surrealismo histórico ou bretoniano (veja-se a propósito o meu ensaio Força de Imagem - O Surrealismo) o que mais longamente perdurou, já que manifestou uma preocupação internacionalista, guiada com a maior inteligência pelo génio de André Breton, que desse modo veio por um lado a contaminar não apenas artistas que de outro modo seriam de expressão local e que assim se internacionalizaram - de Frida Khalo a Roberto Matta os exemplos seriam inúmeros - como, por outro lado, a influenciar no plano conceptual o eclodir do Expressionismo Abstracto nos EUA.

Foi na maré gerada pela eclosão deste segundo surto - já que o primeiro ficou para sempre reflectido na história da cultura europeia como uma das suas mais significativas e influentes Vanguardas - que o Surrealismo visitou Portugal e que, na sua arte e literatura, deixou significativas marcas. De um lado, logo em 1940 se falando nele, por sugestão avisada de António Pedro, mas encontrando apenas em António Dacosta um artista à altura de o entender poeticamente; do outro lado com a criação, já no fim dessa década, do Grupo Surrealista de Lisboa e da sua rápida dissenção com Os Surrealistas.

Tal como anteriormente sustentei, partido que foi Dacosta para Paris, do primeiro destes grupos - minoritários ambos -, se haverá de reter o exemplo maior de Fernando Lemos, nas artes visuais, com o esplendor das suas fotografias, e de Alexandre O'Neil na literatura, com alguns dos mais intensos poemas escritos em português do século XX e, do outro grupo, acima de todas a intervenção do génio de Mário Cesariny quer no plano plástico quer no poético, mesmo se longamente irreconhecido no primeiro, e ainda o talento maior de Cruzeiro Seixas. Dois artistas cuja conjunta influência haveria de vir a ter a maior importância no sequente evoluir da arte portuguesa, sobretudo a partir de finais da década de cinquenta e logo que esta se começou a ver livre do aborrecimento neo-realista que a afligira por mais de uma década.

Seria pois na afirmação progressiva desta dupla influência que se iria preparar uma grande parte dos caminhos da arte portuguesa na década de sessenta. Por um lado, com a influência que a obra destes exerceu em jovens artistas depois tão importantes como Paula Rego, ou mais desconhecidos como José Escada, por outro lado, com a decisiva importância que essa influência revestiu na formação de outra família, igualmente decisiva, que se poderia simbolizar na obra de António Areal. Foi assim que o Surrealismo em português, tardio embora, foi marcante no desenvolvimento posterior da arte portuguesa, sobretudo para a sua abertura a uma visão internacional. Internacionalista ele mesmo (recorde-se a presença de Cesariny em imensas exposições europeias e norte-americanas) foi influenciando sucessivas gerações. Das que se abriram a outras derivas (no caso de Paula Rego a uma procura de relações com a Art Brut, no de Areal pelo encontro com o campo das Novas figurações) àquelas cujos artistas lhe permaneceram fiéis, continuando a cultivar o interesse pelo imaginário onírico tal como se havia definido sobretudo a partir das obras de De Chirico e depois de Salvador Dali. Estes últimos ficando sobretudo mais próximos da obra de Cruzeiro Seixas cujo preciosismo desenhístico em certa medida continuaram.

Entre estes artistas que optaram por continuar o rasto mais forte da imagem do surrealismo onírico contam-se, em Portugal, sobretudo os nomes de Raúl Perez e de Mário Botas. Deste último, cuja morte prematura lhe deixou obra intensa mas breve, regista-se sobretudo o gosto por uma quase abjecção, de gosto neo-simbolista e forte dimensão literária, expressa em desenhos minuciosos, plenos de referências ao imaginário romântico, e depois modernista e simbolista, que ora se detêm numa certa melancolia herdeira do spleen baudelaireano, ora parecem gritar de um espectral sentido do mórbido, provavelmente decorrente do facto do artista se saber condenado, desde cedo, por uma doença sem cura.

No caso de Raúl Perez, ao contrário, o seu universo sendo embora nocturno - e, nesse sentido, muito mais próximo do de Cruzeiro Seixas, cujo negrume é recuperado nos fundos de céu escuro - não há nele propriamente morbidez ou, sequer, um sentido ilustrativo, versado pela literatura e pelas referências eruditas como acontece em Botas. Muito mais próximo do imaginário de uma certa pintura surrealista, ele recupera (como em certa medida Seixas), uma memória das paisagens desertificadas, à maneira de DeChirico, invadidas por estranhos seres, ou fragmentos de figuras humanas que se metamorfoseiam em pedaços de corpos de humanos ou de animais. Por outro lado, os edifícios de recorte longo das suas arquitecturas não deixam igualmente de evocar aquelas estranhas casas de DeChirico, cujo esvaziamento surdo se torna tão perturbante.

Muito densas e preciosas de um virtuosismo desenhístico, as obras de Perez prolongaram por quase quarenta anos, a revisitação a esses espaços de enigma e de saturação que acabaram por o singularizar nessa forma do fantástico que lhe permitiu, como de certo modo a Roland Topor, fazer a deriva de um universo ainda de cunho abertamente surrealista para um outro, quiçá mais original nos seus sentidos, cuja chave está mais do lado daquilo a que Pierre Mabille chamou em tempos "o maravilhoso". É assim que os seus desenhos lentos, como os seus óleos preciosos de um gosto delicado e quase tocando o absurdo, parecem abrir para um espaço em que o tempo ficou congelado.

E se tomarmos, de todo o seu conjunto, um apenas, de 1976 e sem título (desenho nº 18), em que estranhas figuras quase rastejam simbolizando o masculino e o feminino através de serpentes e de formas mistas de coração e vulvas, apercebemo-nos do quanto este artista procura, através do constante metamorfosear das figuras, chegar a tocar a compreensão de uma qualquer dimensão secreta em que sonho, erotismo e a fantasmagoria de ambos parece condensar a percepção de um qualquer intocável.

Raúl Perez parece pois trabalhar para o interior de um cada vez mais silencioso espaço, em que se misturam sussurros e visões, anotações de um mundo contíguo ao nosso em que sonhar é um modo de aperceber, mais nítidas, outras dimensões e aflorações do real.

E é por esse conseguimento de estranhezas várias que a sua obra se insinua, quase discretamente, como registo de uma espécie de memória dobrada sobre si mesma, em que se evocam tempos diversos e espaços igualmente diversificados, que se associam por associações imprevistas. E que, como tal, prolonga esse gesto surrealista que, tendo sido tardio em Portugal e na sua arte, não deixou de se querer continuado ainda até aos nossos dias.

Bernardo Pinto de Almeida
Janeiro 2009 ."


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